Folha de São Paulo
Para acolher antiga reivindicação dos militares, Temer alterou a legislação.de forma a permitir que sejam julgados, a partir de agosto, pela Justiça Militar sobre crimes praticados durante operações de rua. Até então, um caso de homicídio, por exemplo, era julgado pela Justiça comum.
O episódio mais marcante do processo de militarização no Executivo ocorreu na semana passada, quando o então ministro da Defesa, Raul Jungmann, migrou para o novo Ministério Extraordinário da Segurança Pública e colocou em seu lugar o general Joaquim Luna e Silva.
Ainda que interino no papel, Silva passou a ser considerado pelos militares um ministro definitivo.
No dia da posse de Jungmann, o comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, tratou Silva como titular e sugeriu que a escolha foi tratada com oficiais da Marinha e da Aeronáutica, ao dizer que “foi unânime o entendimento das Forças”.
Ante a repercussão negativa de um militar no cargo, Temer estaria, segundo a Folha apurou, procurando um diplomata para ocupar a vaga.
O general do Exército Roberto Severo Ramos assumiu a chefia de gabinete da Casa Civil no início da gestão emedebista, substituindo uma sequência de nomes civis desde o início do governo Dilma.
Pela Casa Civil, passam as nomeações e as negociações de cargos, além da interlocução com o Executivo.
Na quarta (28), após seguir para a reserva, o general Antonio Mourão, da ala à direita na Força, deu sua explicação sobre a presença maior dos militares: “A coisa é muito simples. O Exército não é apolítico, ele tem que ser político. Ele tem que exercer a política dentro dos seus limites, mas ele é apartidário. Porque o Exército não serve ao governo, serve ao Estado e à nação”.
A militarização de cargos no Executivo, porém, não foi vista como muito simples por atores políticos. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que “sobretudo os governos que não são fortes acabam apelando para militares”.
A organização não governamental Human Rights Watch manifesta preocupação com os sinais de que o Exército, valendo-se da nova lei adotada por Temer, levanta obstáculos para colaborar com o Ministério Público e a Polícia Civil do Rio a fim de apurar a chacina de oito pessoas durante operação conjunta em 11 de novembro no Complexo do Salgueiro.
A autoria do crime é desconhecida. “Vemos nesse episódio uma potencial violação dos direitos humanos”, disse a diretora da ONG no Brasil, Maria Laura Canineu.
Procurado pela Folha, o Planalto afirmou que “procura os melhores quadros para a administração pública, não importando se são civis ou militares”.
A afinidade de Temer com as Forças Armadas é anterior à sua atual tentativa dele de adotar perfil linha-dura. Como vice-presidente, ele foi escalado para coordenar o plano nacional de fronteiras, o que o aproximou dos militares.
Durante o impeachment de Dilma, recebeu manifestações reservadas de apoio de generais de alta patente e, desde que assumiu o Planalto, faz questão de comparecer a eventos militares.
Sobre a chacina no Salgueiro, o CML (Comando Militar do Leste), responsável pela intervenção no Rio, informou na semana passada que já existe um IPM (Inquérito Policial Militar) instaurado para apurar os crimes.
Presidente trocou civis por militares em cargos estratégicos
Maio.2016
General Sérgio Etchegoyen passa a ter controle sobre a Abin; é recriado o GSI (Gabinete de Segurança Institucional).
Entre 2015 e 2016, a Abin ficou subordinada ao controle civil na Presidência.
Julho.2016
General da reserva Roberto Ramos é nomeado chefe de gabinete do ministro Eliseu Padilha (Casa Civil).
Abril.2017
General da reserva Carlos Santos Cruz assume a Secretaria Nacional de Segurança Pública.
Primeira vez que o órgão é ocupado por membro das Forças Armadas desde sua criação, em 1997.
Maio.2017
General da reserva Franklimberg Freitas assume como interino a presidência da Funai; dois meses depois,é efetivado no cargo.
Primeira vez que um militar ocupa o cargo desde 1991.
Outubro.2017
Temer sanciona lei que transfere da Justiça comum para a Militar certos crimes contra a vida cometidos por militares durante operações de rua.
Fevereiro.2018
Temer nomeia o general Braga Netto como interventor na segurança pública do Rio .
É a primeira intervenção do gênero desde a Constituição de 1988; o presidente legalmente poderia ter escolhido um civil.
Fevereiro.2018
Com a criação do Ministério da Segurança Pública, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, é substituído pelo general Silva e Luna.