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24 de Fevereiro de 2017 às 09:27

Mobilização no Senado para excluir retrocessos no projeto do estatuto da segurança privada


Crédito: Reprodução

Um painel realizado no último sábado (18), durante o Congresso Extraordinário dos Vigilantes, promovido pela CNTV, em Brasília, apontou avanços inegáveis, mas também retrocessos inaceitáveis no projeto do estatuto da segurança privada (PL 4238/2012), aprovado na Câmara dos Deputados e agora em tramitação na Comissão de Assuntos Sociais do Senado. O relator é o senador Vicentinho Alves (PR-TO). Foi definido um processo de mobilização de vigilantes e bancários junto aos senadores e senadoras para excluir os retrocessos. Se aprovado, vai à sanção presidencial para transformar-se definitivamente em lei.

O presidente da CNTV, José Boaventura, recordou que o projeto é oriundo da comissão especial do piso nacional dos vigilantes da Câmara, formada sob o comando do deputado cassado e preso Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para apreciar o PLS 135/2010, do ex-senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), aprovado no Senado em 16 de junho de 2012. Cunha apensou 122 projetos que tratavam de segurança.

Após ter sido aprovado na comissão especial em 16 de maio de 2016, o sexto substitutivo do relator, deputado Wellington Roberto (PR-PB), foi aprovado no plenário da Câmara em 29 de novembro. “O texto não tem piso, frustrando os vigilantes, mas traz o estatuto da segurança privada”, destacou Boaventura.

Bancada BBBB

A deputada federal Erika Kokay (PT-DF), que integrou a comissão especial, disse que, apesar da conjuntura adversa, foi possível garantir avanços e barrar alguns retrocessos, como a legalização do “bico” dos policiais.

Erika, ex-presidenta do Sindicato dos Bancários de Brasília, denunciou que “a mídia fala na bancada BBB no Congresso, mas esconde que na realidade o que existe é a bancada BBBB: B de boi (ruralistas), B de bala (segurança), B de Bíblia (igrejas evangélicas) e, a mais poderosa, B de bancos”.

O estatuto não é novidade. Trata-se de uma iniciativa da Polícia Federal para atualizar a lei federal 7.102/83, que se encontra defasada, embora seguidamente é descumprida pelos bancos e empresas de segurança. A primeira versão foi elaborada em 2005. Foi objeto de muitas reuniões e debates com entidades sindicais dos bancários, vigilantes, bancos e empresas de segurança, inclusive no Ministério da Justiça, mas nunca chegou a ser enviado pelo governo ao Congresso.

A redação aprovada na Câmara regulamenta a profissão dos vigilantes, define a atuação das empresas de segurança privada e de transporte de valores e disciplina os procedimentos de segurança em bancos, dentre outros pontos.

Clique aqui para ler a íntegra do texto aprovado.

Proteção à vida

Há importantes avanços como a inclusão da “proteção à vida” como um dos princípios a ser observado na prestação dos serviços de segurança privada. “Foi uma proposta feita pela CNTV e Contraf-CUT ao longo dos debates com a Polícia Federal”, lembrou Boaventura.

O diretor da Contraf-CUT e ex-coordenador do Coletivo Nacional de Segurança Bancária, Ademir Wiederkehr, fez uma apresentação mostrando os impactos para os bancários. Ele frisou que “o estatuto garante mais segurança nas agências bancárias, mas traz retrocessos e problemas que precisam ser corrigidos no Senado”.

Mais segurança para bancários, vigilantes e clientes

Além do mínimo de dois vigilantes com coletes balísticos e do alarme interligado, as agências deverão ter portas de segurança com detector de metais, sistemas de circuito interno e externo de imagens em tempo real e artefatos que garantam privacidade nas operações nos guichês de caixas, dentre outros procedimentos.

É vedado aos bancários fazer transporte de numerário ou valores. É também permitida a guarda de chaves de cofres e das dependências de instituições financeiras nas instalações de empresa de segurança, “o que evitará que os bancários levem tais chaves para casa, deixando de ser alvos de sequestros”, salientou Ademir, que também é diretor do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e secretário de Comunicação da CUT-RS.

Tentativa de freio nas greves

No entanto, existem graves retrocessos no projeto aprovado na Câmara que precisam ser corrigidos no Senado. Até propostas que nada têm a ver segurança, mas com o Direito do Trabalho foram inseridas no texto.

No artigo 31 do projeto, que trata do funcionamento dos bancos, consta no parágrafo 1º que são considerados “essenciais tanto os serviços por eles prestados para efeitos da lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, quanto os inerentes à sua consecução”.

A lei nº 7.783 é a que garante o direito de greve e estabelece os serviços essenciais. Na medida em que o projeto inclui “os inerentes à sua consecução”, fica evidente que a intenção é ampliar os serviços para tentar frear o exercício da greve. Essa inclusão tem as digitais dos patrões. “Isso me lembra daquela história do jabuti em cima da árvore: ou foi enchente ou foi mão de gente”, comparou Ademir.

 

“Interesse nacional” para acabar com leis municipais

Já no parágrafo único do artigo 1º, o projeto incluiu outra proposta que atende o poderoso lobby dos bancos. “A segurança privada e a segurança das dependências das instituições financeiras são matérias de interesse nacional.”, diz o texto.

O objetivo é barrar leis municipais e estaduais que já salvaram milhares de vidas diante do descaso dos bancos. Existem várias decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que garantem a constitucionalidade de leis municipais, como a que obriga a instalação de portas de segurança nas agências. “O artigo 30 da Constituição Federal prevê que os municípios podem legislar sobre assuntos de interesse local, como é o caso da segurança nos bancos”, destacou Ademir.

“Querem calar vereadores, prefeitos, deputados estaduais e governadores de legislar sobre um dos temas mais debatidos pela sociedade, enquanto cresce a violência, a criminalidade e a insegurança”, alertou Boaventura. Ele acrescentou que a expressão “interesse nacional” poderá fazer um estrago sem precedentes nas relações trabalhistas.

Negociado sobre legislado

O presidente da CNTV criticou duramente a inclusão de um dispositivo que caracteriza “o negociado sobre o legislado” no parágrafo quarto do artigo 29 do projeto. Consta que “é facultado às partes, mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho, que prevalecerá sobre o disposto em lei, ajustar jornada de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, podendo os intervalos para repouso e alimentação serem usufruídos ou indenizados na remuneração mensal”.

Multas contra bancos corrigidas pela metade da inflação

Apesar dos seus lucros gigantescos, as multas contra os bancos infratores foram corrigidas somente pela metade da inflação desde 2000, quando a UFIR foi extinta. Assim, a multa mais alta é atualmente de 20 mil UFIR, significando R$ 21.282,00. O projeto estabelece multa até R$ 30 mil. Se fosse corrigida pelo IPCA do período, o valor seria mais de R$ 60 mil. Os bancos foram beneficiados, o que o Senado precisa modificar.

O projeto possui outros retrocessos, como a inclusão de um termo de compromisso de conduta entre bancos e empresas infratoras com a Polícia Federal, o que poderá suspender o pagamento de multas se as regras forem cumpridas dentro do prazo estabelecido. “Nenhum outro infrator dispõe de tal benefício na sociedade”, criticou Ademir.

Há ainda uma redução para no mínimo um vigilante nos postos de atendimento, o que fragiliza a segurança e piora as condições de trabalho.

Prazo de até quatro anos para instalar portas de segurança

Além de não ter incluído várias reivindicações de bancários e vigilantes, como vidros blindados nas fachadas e vigilância 24 horas, há também problemas no texto aprovado, como os prazos generosos e parcelados de adequação à nova lei. Os bancos teriam até quatro anos para instalar os equipamentos de segurança, como as portas de segurança, em 100% das agências. “Um período muito longo para o setor que mais lucra no Brasil”, criticou Boaventura.

Cooperativas incluídas, menos em municípios abaixo de 20 mil habitantes

O estatuto será também aplicado às agências e postos de atendimento de cooperativas de crédito, o que é uma importante conquista, pois a atual legislação não inclui essas instituições que atuam como se fossem bancos. Entretanto, a lei dispensa unidades localizadas em municípios com população inferior a 20 mil habitantes, que ficarão expostas a ações criminosas.

Outro problema é que o projeto possibilita que a Polícia Federal reduza os dispositivos de segurança, levando em conta o número de habitantes e índices oficiais de criminalidade, o que torna vulnerável a segurança e coloca em risco a vida de bancários, vigilantes e clientes. Além disso, vários itens do estatuto dependerão de regulamento da Polícia Federal.

 

Conselho Nacional de Segurança Privada sem regulamentação

O projeto define que “o Ministério da Justiça poderá instituir um Conselho Nacional de Segurança Privada (CNASP), de caráter consultivo, vinculado ao Ministério da Justiça, e composto por membros do governo, da classe empresarial e da classe laboral, destinado a assessorar o Ministro da Justiça em assuntos de segurança privada e a elaborar políticas para o setor”. No entanto, nada consta acerca do regulamento, atribuições e funcionamento.

Ouvir especialistas

Ademir destacou a necessidade de analisar com profundidade o projeto aprovado, consultar especialistas no assunto e construir emendas para levar ao Senado. Em entrevista publicada no último dia 16 na Rede Brasil Atual, o advogado criminalista e procurador aposentado do Ministério Público de São Paulo, Roberto Tardelli, alertou sobre o perigo que representa o projeto.

Clique aqui para ler a entrevista de Tardelli.

“Essa lei cria um exército privado e sem controle”, apontou. “A lei foi originada só para definir esse piso, mas depois foi ganhando diversas emendas e virou outra coisa, virou um sapo com asa”, avaliou Tardelli.

Mobilização no Senado

Erika, Boaventura, Ademir e o advogado da CNTV, Jonas Duarte, reforçaram a importância da atuação das entidades sindicais dos vigilantes e bancários para garantir os avanços e excluir os retrocessos do projeto no Senado.

“Nossa primeira recomendação é o estudo e o debate da proposta aprovada na Câmara. Se a atual lei já regula a nossa atividade por 33 anos, esse texto poderá regular nossa vida e profissão por mais 50. O momento é de fazer história”, defendeu o presidente da CNTV.

Para Ademir, a solução passa muito pela mobilização junto aos senadores e às senadoras. “Temos que dialogar e propor audiências públicas no Senado para ouvir todas as partes envolvidas, bem como pressionar os parlamentares em Brasília e nos estados, ao mesmo tempo em que lutamos contra as reformas da Previdência e trabalhista e contra a terceirização sem limites”, defendeu.

A deputada reafirmou o seu compromisso com as lutas da classe trabalhadora e se colocou à disposição para continuar defendendo os interesses de vigilantes e bancários na Câmara.

Fonte: CUT-RS com CNTV


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